Novo Airão (AM)
- Humberto Fois-Braga
- 22 de set. de 2016
- 2 min de leitura
Novo Airão, cidade cartesiana no traçado das ruas e da ausência nos discursos cotidianos, tenta expulsar a Floresta Amazônica que a circunda à espreita ao mesmo tempo em que busca dominar o Rio Negro que a serpenteia com suas cheias.
A cidade é (d)oRio Negro: lenta(o), com sol que sufoca na superfície enquanto perigos e anseios rondam debaixo d'água, abaixo do frágil espelho urbano que é capaz de se desfazer com um simples toque, misturando os mistérios do fundo com o sol de cima, expondo seres fantásticos e afogando a luz.
A praça principal de Novo Airão, enquanto alegoria desta batalha lenta e dissimulada travada entre a cidade que persiste em existir e a Floresta e o Rio que tentam invadi-la, serve de alerta aos passantes: ou se vive no coreto civilizatório ou se é esmagado pelas forças dos elementos primários e naturais - a estátua do dinossauro, posta no meio de um canteiro de areia, é o espectro de Airão Velho, abandonada pela ausência da seringueira ou pela abundância de formigas (não importa se tenha sido pelo excesso ou pela falta), que ronda o Novo. O dinossauro na areia, em sua simpatia, relembra a todos de um passado, deixando claro que a vida cíclica da Floresta é capaz de criar um Novo Airão Velho; deixando como única solução para o "fantasma urbano abandonado" a vontade de criar o "Novíssimo Airão", mais ao sul, Rio abaixo.

No fluxo da água vai a cidade em sua segunda tentativa de urbano (Velho-Novo-Novíssimo?), enquanto no contra-fluxo da Estrada chegam os turistas. E nestas idas e vindas de cidades e pessoas, a Ponte, ser mítico recém gerado e que une as duas margens do Rio Negro, aproximando Novo Airão de Manaus, parece surgir como a mais nova arma de dominação humana sobre o Rio e a Floresta. Um cordão umbilical para não se perder, uma direção de fuga, se necessário.
E dentro destes fluxos de idas e vindas, de cheias e secas, a única ação que parece imutável é o discurso da falta, da ausência, do vazio e do "tem mais acabou", que se alastra pelas ruas e comércios, fazendo com que o visitante recém-chegado seja alertado sobre o ambiente por onde se embrenhou. Nas falas do "não tem", o forasteiro é jogado dentro do campo de tensão criado pela abundância natural de um lado e, do outro, a carência dos produtos industriais tidos como traços civilizatórios modernos.
Mais do que para presenciar o ex-ótico do "Brasil do Norte", visita-se Novo Airão para participar e ser parte deste embate entre o natural imaginado e o urbano construído. Ambos, natureza e civilização, idealizados e romantizados. Lá se sufoca, se afoga e sente-se falta.
- A partir de viagem realizada do dia 30/01/2012 a 07/02/2012.
Comentários